“Grey Gardens” é o esboço exato da intimidade de duas mulheres que sobrevivem numa existência baseada na relação oscilante entre amor e
ódio. Big Edie (mãe) e Little Edie (filha) se desentendem constantemente, comem juntas, cantam, tecem filosofias sobre a vida
e sobretudo falam sobre o passado. Todas as falas envelhecidas - à primeira vista, irrelevantes - indicam, ao
que parece, que elas vivam em uma espécie de lugar atemporal - o que é Grey
Gardens - sem conceito de tempo, mas bem
conceituado como lugar, afinal trata-se de uma mansão abundante em
memórias, contadas por Little Edie, e deve ser considerada como uma
personagem. A casa possui um aspecto deteriorado, quartos com gatos e
guaxinins que circulam livremente, coberta de vegetação, o que nos
remete a uma ilha, separada do resto do mundo e com certeza, no
psicológico das nossas "atrizes sociais", de fato é. Apesar das ameaças
incessantes de Little Edie deixar "Grey Gardens" para
seguir sua vida, mãe e filha vivem normalmente e não há queixas
sobre as condições de vida imundas a que estão sujeitas. Além
disso, a despeito do documentário parecer o retrato de uma grande
tragédia, a produção é surpreendentemente divertida pelo modo
como Big Edie dá puxões de orelha na filha e essencialmente pela
figura de Little Edie e suas expressões de moda fora do comum.
Engenhosamente, ela entrelaça vestidos e saias com trajes feitos a
partir de materiais encontrados pela casa, como toalhas de mesa ou
qualquer tipo de tecido. Seu estilo incomum é acentuado pela
variedade enorme de lenços e adereços que usa na cabeça durante
todo o filme, o que me deixou sempre a espera da próxima produção
inusitada e me fez perguntar se Little Edie tinha, pelo menos, um fio
de cabelo na cabeça. Aliás, essa é somente mais uma das muitas
questões que não encontrei resposta, do mesmo modo que me perguntei
como essas duas mulheres, antigamente ricas, acabaram em tais
circunstâncias. Eventualmente Little Edie me responde um outro
questionamento: o que a levou a deixar sua vida e
permanecer com sua mãe em Grey Gardens?
“…
a
marca registrada da aristocracia é a responsabilidade, certo?”.
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